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quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Quando aquele dia chega


Antes de ler, você poderia, por gentileza, clicar aqui e ouvir essa música enquanto lê? 'u' fico agradecido se o fizer.

Existe uma época especial em nossas pequenas vidas humanas. Uma data onde largamos o nosso pequeno espaço confortável, sob o qual crescemos, para criar nossas próprias histórias, para adquirir o protagonismos de nossas próprias sagas.

O dia que saímos de casa.

Mesmo que a convivência familiar tenha seus defeitos, mesmo que aquele seu irmão menor bagunce suas coisas, mesmo que você tenha entrado em divergência com sua própria casa mil e uma vezes, inevitavelmente, existe um impacto ao sair do lar. (É óbvio, não é dessa forma para todo mundo).

Aquele momento, em que nós saímos pela porta da frente, com nossas malas e olhamos para trás para acenar.
"Tchau pai, Tchau mãe"

Aquele momento que sentimos, de forma implícita, que a partir daquilo muito coisa será diferente.
"Tchau dog, Tchau irmãozinho"
Talvez, seja um dos momentos mais impactantes da vida de nós mortais (mesmo que não notemos durante o ato).


O carro se afasta e pela janela passa a imagem de tudo que compôs nossa vida até aquele presente momento. As ruas, as casas, as pessoas, tudo sendo deixado para trás, tudo passando diante de nossos olhos, tudo indo embora. Adentrei no misto do entusiasmo pelo desconhecido com o peso de ver o meu pequeno mundo indo embora.

Um desejo, criado na adolescência, um dia se torna realidade: tornamo-nos protagonistas de nossas próprias vidas, a partir de tal momento tomamos decisões por nós mesmos. Mas existe um preço a se pagar por isso.

Nostalgia

Posso me lembrar da melhor receita da mamãe, aquele macarrão com molho, ficava feliz ao saber que seria esse o almoço.
Posso me lembrar da minha cama, não era a mais confortável do mundo, mas eu me sentia mais calmo, mais leve, ao deitar nela.
Posso lembrar do meu quarto, não tinha a maior privacidade do mundo, mas mesmo assim era um ótimo abrigo para os maus momentos, era um bom lugar para se refugiar, lá eu me sentia seguro.


As vezes, pode ser muito doloroso olhar para trás e querer voltar aos tempos de criança, onde tudo era tão inocente, onde você podia se refugiar, onde as coisas - mesmo que não parecessem - eram mais felizes.

Pode ser dolorido saber que esses tempos não irão voltar.

Mas é o preço que se paga por buscar novos dias felizes.
É o preço que pagamos por crescer.

"Vai chegar um dia que você sairá de sua casa e fará outra
Não tenha pressa
Isso ocorrerá"

Os olhos falam


Talvez, seja um tema clichê.
Quem não sabe que os olhos falam?
Quem nunca notou, nos olhos, uma mensagem que não havia nas palavras ditas pela boca ou nos gestos feitos pela mão?

As vezes, queremos esconder determinados sentimentos, esconder certos pensamentos. Mas, nossos olhos nos traem, eles nos entregam, sem dó e piedade, sem qualquer consentimento.


O brilho radiante em seu fundo que indica inspiração
Ou sua ausência que indica vazio interior
Indicando dor
O pedacinho de lágrima em seu canto querendo desabar
A fúria em seu avermelhar
A serenidade, calma e paciência de amar
O olhar cintilante com a malícia de desejar

Os infinitivos prosseguem infinitamente nas possibilidades múltiplas que nossos olhos oferecem. Alguém, em algum um dia escreveu ou falou que os olhos são as janelas da alma, não lembro tal autor, mas não posso deixar de reafirmar tal verdade. Mas talvez, eu possa fazer um acréscimo:

Óculos escuros não protegem os olhos do sol e sim a privacidade de nossa alma da curiosidade de outras pessoas.

quarta-feira, 7 de setembro de 2016

O grito do silêncio


Uma vez eu conversava com uma pessoa que admiro muito, em dado momento nosso diálogo chegou no tema "silêncio".

Ah eu não posso negar, existem momentos que eu busco o silêncio.
Muitas vezes, principalmente a noite, eu procuro me isolar em algum lugar para não escutar fala humana ou barulho de animal. Nesses momentos eu busco o silêncio de forma instintiva.
Eu busco o silêncio para refletir, para pensar, para ficar só no meu pequeno universo introspectivo.
Me agrada ficar só ouvindo o barulho dos objetos e coisas ao meu redor, como o som do ventilador, das folhas balançando ao vento, das cansadas máquinas de refrigeração que trabalham constantemente. Óbvio, isso não é silêncio, mas eu considero como se fosse.

Voltando ao diálogo.
Essa pessoa com quem eu conversava dizia não gostar do silêncio porquê ele "grita verdades" e algumas verdades podem doer.
(Ou todas doem?)

"O silêncio grita verdades"
"As vozes que falam em sua cabeça passam a falar mais alto"

Eu, uma pessoa extrovertida que por vezes busca a solidão, separei um momento noturno para divagar sobre aquilo.
Passamos a maior parte do dia interagindo com outras pessoas, por mais que sejamos indiferentes a elas. Interagimos com o cobrador do ônibus, com os colegas de trabalho, com os familiares, com os vizinhos, com as pessoas de quem compramos coisas e com as pessoas a quem vendemos coisas. Inevitavelmente, interagimos. Mas e quando estamos sozinhos é o único momento que temos para escutar a própria voz e não a do outro.

Quantas vezes você se escuta por dia?

"O maior problema da solidão é notar que está sozinho" completou a pessoa com quem eu conversava.
Quantas vezes nós não estamos sozinhos, porém, distraídos e esquecemos a própria solidão?
O silêncio não incomoda quando nós não o notamos.
Mas notá-lo e permanecer nele, em ócio, por um longo tempo é como receber uma facada na alma.

Inúmeras vezes minhas conversas da madrugada terminavam mais cedo que meu sono chegava e lá estava eu buscando formas de ocupar minha noite - já esgotado de redes sociais e diálogos rasos facebook - quando então notava minha solidão. Quando surgia o momento da minha mais produtiva (ou destrutiva) reflexão.
Eu passava a escutar meus próprios pensamentos.
Eles gritavam.

Entre as noites de divagação eu cheguei à seguinte conclusão: para existirmos é preciso que alguém note nossa presença e interaja com ela.
Afinal, de quê adianta conhecer o lugar mais belo do mundo e não ter para quem mostrar?
De quê adianta descobri o segredo mais secreto do mundo e não ter para quem contar?
Compartilharemos coisas ao silêncio então?

A minha teoria é de que muitos escritores escrevem para que as vozes que gritam no silêncio sejam silenciadas - pelo menos eu sou um desses.
Mas há uma pequena frustração:

Falamos em forma de grafia, mas escutamos em forma de silêncio.

O terror de um drama familiar em forma de telas - análise de Layers of fear


Obsessão, decepção e rancor são as palavras que norteiam o assombroso drama de Layers of fear.

"todo retrato pintado com sentimento é um retrato do artista e não do modelo"
A frase de Oscar Wilde que dá início ao jogo é a completa definição do que trata a obra: o artista e sua forma de materializar a própria alma. Os sentimentos, as lembranças e as cicatrizes tomam a forma de pinturas, mas quem está sendo pintado no quadro? O que está sendo pintado no quadro? Para isso precisamos saber quem é o artista, qual sua história e quais são seus pensamentos. Layers of fear é um jogo que conta um drama familiar traumático de um artista obcecado.


Em primeiro lugar, eu gostaria de declarar que fiquei apaixonado pelo jogo após encerrá-lo. Eu confesso estar exausto de jogos/filmes/contos de terror que seguem sempre o mesmo padrão (é entendiante, não acha?), Layers of fear é um jogo que trabalha todo medo de forma diferenciada (até na forma de jogar) e traz consigo uma história simples contada de uma maneira interessante. E EU como amante de um bom drama e entusiasta do terror, não poderia deixar passar essa oportunidade por mim (digo, oportunidade de levar bons sustos e conhecer uma nova história).
E confesso: teve trechos que eu fiquei realmente arrepiado.


O jogo trabalha o medo de forma interessante utilizando a ambientação como arma principal, variando de lugares calmos e tristes à extremamente hostis e medonhos. Vale ressaltar a riqueza visual: o jogo conta com ambientes extremamente criativos e vários quadros maravilhosos e enigmáticos (sempre achei que pinturas e terror fossem uma boa combinação, Layers of fear exemplifica o quanto isso dá certo). Outra grande arma desse terror é o áudio que também é maravilhoso e muitas vezes me deixou bem neurado, possuindo uma trilha sonora convidativa desde o primeiro contato (não tão convidativa assim depois kkk).

O que me manteve jogando até o fim foi a curiosidade, afinal, a história do jogo é contada em mil e um pedaços dispersos: cartas, bilhetes, pedaços de jornal, objetos que trazem à tona a memória do pintor, desenhos na parede e etc. Para entender o enredo é preciso ter muita atenção aos detalhes e esse é um jogo cheio de detalhes. Confesso que sou daqueles que passa reto por um corredor sem checar nada, mas a curiosidade me manteve vasculhando os ambientes pelo qual eu passava para entender o que havia ocorrido.

E o que havia ocorrido?

Essa é a pergunta chave do jogo que não dá nenhuma conclusão pronta para o jogador. Jogar Layers of fear é como ler um livro cheio de detalhes implícitos que precisam ser conectados mentalmente (que não é nenhum sacrifício dado a simplicidade da trama).



Um dos cenários belos do jogo

A imersão do jogo é absurda, o enredo intenso (que pede não só para ser observado, mas vivenciado) retrata em diferentes camadas (layers) o drama do indivíduo para com sua obra e vida pessoal, há uma correlação entre o desandar dos trilhos e a perca de direção nos dois caminhos. Camadas de problemas se tornando cada vez mais profundos, dores que vão ficando cada vez maiores. O jogo apresenta a semente da autodestruição do protagonista e o crescer dessa árvore maldita até frutos que ele chega a colher.

Sabe aqueles filmes que você assiste e precisa discutir sobre aquilo que foi discutido na tela da TV? Layers of fear não é muito diferente, não há "ponto incial" e nem "ponto final". Há somente uma obra para ser vivida, pensada e discutida.

Eu recomendo e muito esse jogo, os controles são simples de forma que qualquer um possa jogar, têm legendas em português e não se estende mais que sete horas. É uma experiência que vale a pena conhecer (caso você não tenha problemas cardíacos kkkkkkkk).